#clandestina49

Engravidei em novembro de 2015, de um cara que queria transar sem camisinha, eu não deixei e no meio da transa ele tirou a camisinha e gozou. Sim! Tudo porque eu estava bêbada… Estava escuro e só percebi quando vi a camisinha no chão e minha vagina com esperma enquanto o cara tomava banho.

As “amigas” do role disseram: “É só tomar pílula que tudo se resolve.” Eu acreditei, até porque já tinha tomado diversas vezes e tinha funcionado. No dia seguinte tomei a pílula, DIAD e achei que a minha vida continuaria normal.  Passaram os dias… Já estava em dezembro e minha menstruação não vinha. Como a pílula mexe com o nosso organismo, pensei que era um atraso normal.

Moro em São Paulo, mas sou carioca e decidi passar o Natal no Rio de Janeiro com a minha família. Quando cheguei lá no dia 24, passei mal… Pensei que era porque não tinha comido nada e do calor. Deitei… Passei o resto do dia meio mole, pensei que era preguiça e aquele aconchego de casa.

Meia noite, minha mãe resolve rezar com a família… E eu comecei a ver tudo embaçado, suar frio… Quase desmaiei e sentei. Todo mundo se preocupou porque eu sempre fui ativa, era raro eu passar mal. Até que a filha do meu padrasto diz: “você está menstruando certo? Vai vim um dançarino aí hein?” Porque minha profissão é dançarina.

Apesar de ser uma brincadeira, eu fiquei com raiva. Nunca gostei desses tipos de brincadeiras como se não pudéssemos passar por outras coisas além de engravidar. Só que infelizmente ela estava certa. Quando voltei para São Paulo, continuei passando mal e fui ao hospital. O médico perguntou se existia a probabilidade de estar grávida e eu respondi “Não!”

Mesmo assim ele me pediu o teste de urina e quando a enfermeira me perguntou:”você quer ser mãe?!” Eu já estava tremendo… E ela confirmou com outra fita, eu estava grávida. Eu acho que fiquei de outra cor… Ela perguntou o que eu iria fazer, e eu não respondi. O médico comemorou que eu estava grávida e eu ainda calada e triste. Segundo ele, eu iria passar por aquilo porque um filho era um presente…

Cheguei em casa e só conseguia chorar… De raiva, de tristeza e me culpava sempre. Só que não era minha culpa… Isso realmente não era. O pai? Eu decidi não ir atrás dele, porque todas que me apresentaram ele, sabiam que ele era casado, já era até avô mas no role ninguém quis me dizer nada, nem dizer como ele era com meninas bêbadas. E ainda duvidaram de que o filho era dele.

Eu decidi resolver tudo sozinha… Eu não estava preparada para ser mãe e nem queria que ele nascesse dessa forma. Então com meu décimo terceiro salário, resolvi comprar 4 pílulas de um enfermeiro depois de pedir ajuda pra uma menina qual eu soube que já tinha abortado. A primeira tentativa foi no dia 29 para 30 de dezembro.

Ele disse que eu não podia comer por 12 horas, deveria ingerir dias pílulas com chá de gengibre e inserir dias na vagina. Manter minhas pernas pra cima na parede e ficar naquela posição por 6 horas. Eu fiz… Não consegui dormir, não consegui assistir filmes… Só olhava para o teto pedindo para que tudo se resolvesse. Só que ainda chorava. Eu vivia chorando. Estava faltando o trabalho devido os enjoos, não conseguia comer porque sempre vomitava, não conseguia ficar de pé por muito tempo porque já queria desmaiar.

Eu só queria a minha vida de volta… Acabei que entrei em depressão porque aquela tentativa não tinha dado certo. Sangrei pouco e senti umas cólicas fracas. Passei mal no dia seguinte, passei o ano novo deitada na casa de amigos quais sabiam o que estava acontecendo. Todos me apoiaram naquele momento, mas mesmo assim eu me sentia sozinha e sentia que não tinha dado certo.

No dia 5 de janeiro fui fazer ultrassom. Falei pra médica que eu estava grávida, e tinha aparecido sangue na calcinha e queria saber se estava tudo bem. Ela me perguntou sobre o pré natal e eu disse que não tinha começado porque eu ia embora para o Rio de Janeiro. Ela ficou um pouco desconfiada porque eu estava nitidamente triste, mas não me perguntou nada… Me encaminhou para fazer a ultrassom.

Entrei na sala para trocar de roupa e fazer o exame tremendo. É meio louco, mas pedi pra Deus que tudo fosse resolvido ali mesmo (só que no fundo eu sabia que não, porque meus enjoos continuavam). Deitei na maca e o médico começou o procedimento do exame… Colocou em alto e bom som os batimentos do feto e eu desabei. Não chorei, mas meu coração apertou. Não tinha dado mesmo certo e ainda ouvi o que eu menos queria ouvir.

Naquele dia eu cheguei em casa e me senti derrotada. Só queria chorar e ficar no escuro, queria morrer… Eu não tinha pedido por aquilo. Entrei na internet e comecei a pesquisar sobre tudo e sobre vendedores. Achei uma qual muitas mulheres indicaram. Entrei em contato com ela desesperada, ela me acalmou e me enviou mais 4 cytotecs por R$ 600. Meu dinheiro tinha acabado ali… Era tudo ou nada.

Jejuei, introduzi 2 na vagina e 2 debaixo da língua. Senti dores, sangrei um pouco mais do que da primeira vez. Não consegui dormir… Ela acompanhou tudo via WhatsApp e disse que daria certo. E eu no fundo, senti que não ia… No dia seguinte ao menos, consegui andar pelo bairro. Ainda estava faltando o trabalho então foi uma novidade pra mim sair de casa.

Andava e observava as pessoas, a maioria sorrindo e eu triste. Não tinha motivo pra sorrir, eu estava vivendo um inferno porque um cara se achou no direito de fazer o que quisesse comigo. Quando comecei a chorar, decidi voltar pra casa e observei meus seios. Ainda estavam inchados e decidi apertar… Saiu colostro (líquido antes do leite). Me desesperei… Mesmo assim esperei dois dias pra ver se saia a tal da bolha que todo mundo falava na internet… Não saia nada, não sangrava mais e decidi de novo fazer ultrassom. Fiz, ainda estava grávida e com 10 semanas.

Decidi contar pra minha mãe… Decidi ir pro Rio só para ter um abraço dela e ela mesmo sendo contra, me apoiou. Ela entendeu meu lado… Sofreu só de pensar que eu estava passando por aquilo tudo sozinha. Disse que poderia me ajudar a criar o bebê… Só que eu não queria.

Voltei pra São Paulo e pedi ajuda a umas amigas feministas desesperada. Consegui a ajuda e uma visita no mesmo dia na minha casa. Eu estava totalmente desarrumada, descabelada… Quem me conhecia, me via e não acreditava que era eu.

Foram extremamente legais comigo, me acalmaram, acharam um médico que fazia o procedimento mas custava 6 mil reais. Eu não tinha de onde tirar aquele dinheiro e então optamos tentar mais uma vez com as pílulas, naquela vez eram mais. Eu não lembro exatamente quantas, mas foram mais de seis. Todas via oral, debaixo da língua até dissolver. Minha melhor amiga estava comigo e pediu para que eu acreditasse. No dia seguinte…  Jejuei, mas podia beber água as vezes. Colocava as pílulas debaixo da língua de hora em hora.

Não consegui dormir… Tive uma diarréia forte, fui 4 vezes no banheiro, só saía água e sangrava um pouco. Um cheiro fortíssimo… Dessa vez eu consegui dormir um pouco e acordei com dores quais foram piorando. Nada pior do que cólica menstrual… Mas era uma dor diferente, como se tivessem cutucando meu útero com uma agulha. Senti muitas pontadas, comecei a sentir calafrios e a suar.
Minha amiga comprou um remédio pra cólica e fez compressão de água quente para colocar na minha barriga.

Senti dores por umas duas horas. Tomei banho, sangrei um pouco, comi um pouco também e dormi. Estava cansada… Acabada na verdade. Por dentro e por fora.
No dia seguinte senti enjoos e comprei dramin (eu acho que se escreve assim). Pior remédio que já tomei na vida! Fiquei tonta e fiquei mole na cama… Via tudo embaçado, mas consegui dormir. Ainda faltava o meu trabalho, não queria ver ninguém, não queria sair de casa… Queria morrer porque não estava otimista. Mas as meninas que me ajudaram sempre me acalmaram.

No dia seguinte minha amiga chegou em casa e disse “Deu certo amiga!”
Eu não sabia porque ela estava falando aquilo, mas eu sorri e continuei deitada. Até que eu cai no sono por causa dos remédios pra enjoo e dormi. Quando acordei, senti um líquido saindo e fui ao banheiro. Era um líquido marrom e fedia. Decidi ir no médico no dia seguinte novamente e fui.

Estava fraca, mas tão fraca que descia a cada estação do metrô pra sentar e continuar. Eu já não aguentava mais e se não desse certo, eu ia ter que criar aquele bebê. Contra a minha vontade, passar por uma maternidade compulsória.
Cheguei na médica e ela começou a me fazer perguntas, eu disse que tinha sangrado muito há dois dias atrás, e ela queria saber até sobre o pai e eu falei que ele tinha sumido. Ela pediu uma ultrassom e disse para que eu ficasse calma.

Entrei na sala pra fazer a ultra, me preparei e meu coração estava a mil. Era a mesma médica que eu fiz a ultra na segunda vez… Quando ela começou a fazer o exame, eu fechei Meus olhos e pedi:”Deus, eu não aguento mais… Me ajuda!”
A médica não falava nada, começou a coçar o pescoço e me falou:”Eu não consigo mais captar os batimentos… Eu sinto muito!”. Eu me senti estranha e comecei a chorar. Foi choro de alívio? Foi… Mas foi de sofrimento porque no fundo eu não desejo que nenhuma mina passe por isso. Você se sente só, se sente péssima, se sente culpada… Mas eu tinha conseguido.

Fiquei internada no hospital para fazer curetagem. Foi tudo tranquilo, sangrei muito depois do procedimento, mas depois de 3 horas eu parei de sangrar e podia comer. Fiz amizade com uma enfermeira que me deu mais do que ela podia de lanche e eu comia que nem um javali. Ela conversava comigo sobre várias coisas… Ela me distraia o tempo inteiro, fez o papel de mãe pra mim e me dizia sempre “Deus escreve certo em linhas tortas. Um dia você vai ser mãe e vai poder dar uma família pro seu filho.”

Eu saí do hospital feliz… Eu podia sorrir de novo, dançar de novo…
Fazer planos, viajar…
Podia amar de novo…
Podia conhecer pessoas novas…
Podia conhecer um cara legal…
Podia sonhar de novo e planejar quando ser mãe pela primeira vez.

E toda vez que eu conheço uma mina nessa situação eu ajudo. Aborto é questão de saúde pública! Quantas meninas não tiveram a sorte que eu tive? Colocaram um filho no mundo sem querer e sem poder? Quantas morreram tentando abortar?
Decidir abortar não foi uma decisão fácil, mas as circunstâncias ajudaram na minha decisão. Só que a gente tira força de onde não tem e apoio de quem você menos espera. Se você está nessa situação, faça se tiver decidida. A sensação e consciência que você adquire depois disso são incríveis. Mulher tem poder sobre o corpo e sobre as suas escolhas, nunca esqueça disso. 🙂