Arquivo da categoria: depoimento

#clandestina79

Negra, 36 anos, Salvador (BA)

Parece que ainda estou num pesadelo. Nunca imaginei que um dia faria um aborto. Até que me vi numa situação desesperadora, onde pela primeira vez senti vontade de tirar a minha vida. 10 anos de casada, uma filha linda de 4 anos e um marido super parceiro. Vida estável, família cristã, onde o aborto é um pecado grave e abominável. No meio da calmaria, cometi o deslize, o único nesses dez anos de casada: transei com um amigo. A curiosidade de um sexo diferente me atiçou como nunca antes e um mês depois lá estava eu grávida.

Nos primeiros dois meses eu me sentia tão fraca e debilitada que em nenhum momento pensei q essa criança não poderia ser do meu marido. Ao final da 12 semana, quado tive minhas forças renovadas, me abateu uma depressão e a certeza de que essa criança não era do meu marido. Me sentia suja, injusta, como poderia estar fazendo isso? Enganando a todos, enganando meu marido, minha família. E essa criança? Até quando viveria em meio à mentira sobre a sua paternidade? Essas questões estavam me levando a loucura. Certo dia, dirigindo, senti vontade de jogar o meu carro do viaduto para acabar com aquele sofrimento mental. Foi quando pela primeira vez pensei em aborto. Eu não conhecia ninguém que já tivesse feito ou nenhuma clínica clandestina… eu não conhecia nada!

Comecei a pesquisar na internet e cheguei a um contato de uma enfermeira que cobrou 4 mil pelo procedimento. Eu estava desesperada. Peguei um empréstimo e fui até a residência desta pessoa. O procedimento iniciou com injeções no soro de ocitocina e introdução uterina de dilatadores. Tudo foi muito doloroso. Durou um dia inteiro e a expulsão do feto aconteceu em casa. Para todos foi um aborto espontâneo. Me dirigi em seguida para um hospital que fez a curetagem. Em nenhum momento mencionaram que o aborto foi provocado. Fiquei internada 2 dias e tomando antibióticos em casa. Não tive hemorragias. Senti um pouco de cólicas por alguns dias. A dor emocional é destruidora. Todos sabiam que eu estava grávida…então ouço: “Deus quis assim”. Não. Ele não quis assim. Eu escolhi esse caminho e que não terá volta. Tenho vergonha de fazer orações, tenho vergonha de olhar para as pessoas, tenho vergonha de mim mesma. Estou deprimida e só queria poder voltar ao passado e não ter tido aquela transa maldita. Será que um dia Deus vai me perdoar? Será que vou me perdoar? Quero me preparar pra engravidar novamente, só que do meu marido, do meu parceiro. Aventuras, nunca mais!

#clandestina78

Negra, 29 anos, Rio de Janeiro.

Olá meninas , achei muito interessante das página e queria desabafar sobre meu procedimento para vocês.

Acabei descobrindo minha gravidez com 6 semanas de uma recaída com meu ex noivo, isso resultou numa gravidez indesejada. Passei 9 anos com ele e nunca tive um susto, uma única recaída acabou acontecendo.

Estava desesperada e sozinha , ele falou pra eu me virar aí ninguém mandou querer dar o golpe nele achando que ele iria voltar comigo.

E assim fui desesperadamente atrás de alguma clinica no Rio de Janeiro eu pudesse me ajudar.

Acabei entrando em alguns sites e achei um tal moça chamada Débora, pediu uma documentação e exame e me explicou brevemente o procedimento. Ela foi um anjo!

Marquei o dia e fui até o local que ela me passou , cheguei lá estava suando frio e passando muito mal (já estava em jejum conforme foi pedido).

Estava numa sala de espera , quando o médico me chamou.

Entrei ele me fez várias perguntas e lá ele perguntou, você tem certeza da sua decisão?

Eu firmemente respondi que sim e lá se foram os 5.000,00 mais bem pagos da minha vida.
São ótima, foram 30 minutos … apaguei!

Quando acordei já me senti diferente.

Hoje após tudo isso estou ótima, feliz e seguindo minha vida como se isso não fosse um peso.

Eu realmente não estava preparada pra encarar isso sozinha e não me condeno por isso.

#clandestina77

Branca, 22 anos, São Paulo.

É a típica situação a qual achamos que nunca vamos passar. Sempre me cuidei, já ouvi histórias e sempre pensava que estaria longe de vivenciar algo assim. Confesso que algumas cheguei a pensar que a pessoa foi burra ou teve culpa, mas convenhamos que não cabe a mim julgar ninguém.

Tomei pílula por alguns meses há 4 anos atrás, mas devido as mudanças que meu corpo foi sofrendo achei melhor parar, nunca precisei muito, não mantinha relações sexuais frequentemente, então camisinha era um método bom para mim.

Fiz intercâmbio para um país onde o aborto é legal, conheci um cara maravilhoso que também era de um país onde o aborto é legal e gratuito. Ficamos um tempo juntos, mas como já estava com minha volta marcada não criamos esperança de que continuaríamos nos vendo, aproveitamos ao máximo o tempo que tínhamos e foi maravilhoso.

Uma bela noite a camisinha estourou, sabia que não estava no meu período fértil porque controlo minha menstruação há anos, mas não quis arriscar então logo na manhã seguinte saímos para comprar a pílula do dia seguinte. Tomei a pílula, compramos camisinhas de outra marca para não correr o risco novamente e continuamos aproveitando os dias que seguiram, já estava na semana de minha volta.

Sempre fica aquele medo, e se a pílula não funcionar? Mas dessa vez não senti esse medo, afinal anoto tudo e estava de fato no meu período ‘seguro’ para sexo.

Voltei para o Brasil, passados alguns dias percebi que minha menstruação não veio, pensei que poderia estar atrasando devido a pílula. Achei melhor esperar um pouco mais.

10 dias e nada.

Contei para uma amiga e resolvemos comprar um teste de farmácia. A primeira listra era bem forte, a segunda nem tanto, ficamos na dúvida, mas naquele momento já sabia que era verdade.

No dia seguinte fiz o exame de sangue para não restar dúvidas, mas nada novo, deu positivo e pelos níveis estava de aproximadamente 4 semanas.

Em nenhum momento eu pensei em manter a gravidez, foi instintivo, 22 anos, estudante, desempregada, morando com os pais, completamente sozinha. O cara não ia me ajudar muito, 22 anos também, estudante e morando em outro país, no fundo sabia que a responsabilidade sempre cai em cima da mulher.

Tenho duas amigas que passaram pela mesma situação um ano antes de mim, uma resolveu numa clínica, o que pra mim estava fora de cogitação, não tinha nem metade do dinheiro e não queria contar para o cara. Minha outra amiga me passou contato de um coletivo que indica lugares para comprar o medicamento e dão assistência psicológica.

Eu queria resolver aquilo o quanto antes. Enquanto estive fora do país trabalhei e me banquei sozinha, morava sem meus pais e em um país de primeiro mundo. Chegar aqui pra começar do zero e ainda grávida não foi nada fácil.

Marquei com o coletivo na data mais próxima que eles tinham, em 2 semanas, mas estava com muita pressa, tudo me deixava mal, não conseguia sair, não me sentia bem em casa, odiava ter que ver as pessoas e fingir que nada estava acontecendo e fingir que estava feliz por voltar.

Pesquisando encontrei três contatos que conseguiriam o remédio mais rápido, duas eu não senti a menor segurança, parecia mais uma transação financeira e eu achei que tentariam tirar vantagem de mim. A terceira foi muito amigável, me contou que ela mesma passou pela mesma situação, me explicou como foi o procedimento e ficou a disposição para eu tirar dúvidas, ela disse que não vendia o medicamento, só repassava, então não teria lucro nenhum.

Pedi que ela pegasse para mim e no meio da semana ela já estava com ele em mãos. Quando nos encontramos eu estava com muito medo, não conhecia a pessoa e só conseguia pensar no pior, e se ela estivesse armando para eu ser pega? E se não funcionasse? Viver num país onde o aborto é ilegal não impede que as pessoas abortem, só faz com que as pessoas façam o procedimento sem a menor segurança e muitas acabam morrendo no processo.

Acabei contando para o cara, afinal não era um problema só meu, queria dividir a responsabilidade e ter alguém do meu lado. Ele tentou me dar apoio, mas eu percebi que infelizmente a mulher está sozinha nessa hora. Ele não ofereceu dinheiro e eu não tive coragem de pedir, não acho que tenha feito a escolha errada contando, mas me decepcionei muito.

Gastei todo o dinheiro que tinha, fiquei com 5 reais na conta, mas valeria a pena, afinal eu conseguiria voltar a ter minha vida.

Tomei 2 comprimidos e inseri 2 na vagina. 1 hora depois e não sentia nada. 2 horas e nada. 5 horas e nada. 10 horas e nada. Mandei mensagem avisando que não tinha acontecido e a menina me disse para continuar deitada, pois demorava mesmo. Mais de 12 horas esperando, torcendo e absolutamente nada aconteceu.

O desespero foi enorme, não tinha dinheiro, coloquei toda a minha confiança na menina e não acho que tenha sido por maldade, mas de boas intenções o inferno está cheio, é muito irresponsável repassar algo que nem você tem certeza que vai funcionar. Fiquei com tanta raiva, medo e ainda mais insegurança.

Fui na consulta no dia marcado e a médica me pediu um ultrassom, naquele ponto eu já havia pesquisado muito e estava com medo de ter uma gravidez ectópica. Fiz o ultrassom e não parecia real, eu vi o que estava dentro de mim, mas não parecia nada, não senti afeto, não senti medo, nem receio, não senti nada, era muito estranho, só queria acabar logo com essa etapa.

Liguei no telefone que me passaram e consegui marcar para pegar o remédio no final da semana, o medo surgiu novamente, e se forem atrás de mim? E se eu for pega? E se não funcionar? O medo de estar fazendo algo ilegal somado ao medo de abortar e estar sozinha são horríveis, me senti uma pessoa ruim por um tempo, mas eu só estava cuidando do meu futuro, nunca tive vontade de ser mãe e sempre achei ridículo não poder ter direito sobre meu próprio corpo. Ninguém tem o direito de me fazer manter uma gravidez que eu nunca quis.

Nesse ponto eu já não tinha mais dinheiro, por sorte meus pais me deram dinheiro para passar o mês (alimentação e transporte) e foi com ele que consegui pagar o remédio (3 vezes mais barato que o anterior inclusive).

Foi me dado 1 comprimido de mifepristona e 6 de misoprostol. Muito mais do que a vez anterior. Tomei o mifepristona e 24 horas depois coloquei 4 comprimidos de misoprostol debaixo da língua por 30 minutos, depois engoli o que sobrou. Passados poucos minutos eu já sentia algo acontecendo, não era cólica, não sei explicar. Senti muitos calafrios e um pouco de enjoo. Me deu diarreia e um pouco de cólica, nada forte.

3 horas depois coloquei os outros 2 comprimidos debaixo da língua e depois de 30 minutos engoli novamente o resto. Estava com muito medo da dor, pois havia lido que é uma dor muito forte e um sangramento intenso. Eu já estava quase de 9 semanas então estava esperando muito sangue e dor.

Acabei dormindo e acordei 2 horas depois com vontade de ir ao banheiro, quando sentei senti o sangue escorrendo, nada assustador, uma quantidade razoável de sangue.

Voltei a dormir, acordei novamente e senti o que acho que tenha sido o coagulo que tanto falam, mas não foi muito grande e nem senti a dor que todas as mulheres tanto falam.

Eu havia tomado ibuprofeno para a dor e não sei se foi isso que fez o procedimento ser tão tranquilo quanto foi, eu estava esperando o pior, mas foi muito mais fácil do que eu imaginava.

A menstruação continuou por aproximadamente duas semanas, as vezes coágulos pequenos saiam, mas nenhuma dor.

As chances de eu estar grávida eram quase zero, eu me cuidei, mas infelizmente acontece com algumas mulheres, hoje vejo que se tivesse mantido a calma desde o começo teria sido algo muito mais fácil e menos traumático. O aborto vai acontecer, o Estado querendo ou não, nós temos controle sobre nosso corpo e a decisão é nossa. Algum dia se eu quiser ter filhos terei e nunca vou me arrepender do que fiz, não era o momento certo.

#clandestina76

Branca, 27 anos, Porto Alegre.

Sou casada, tenho um filho de 05 anos, tinha iniciado um novo emprego fazia pouco tempo.

Depois que engravidei á primeira vez, sempre me cuidei, tomava os remédios, eu e meu esposo mal estávamos tendo relações, e minha menstruação não desceu, meu marido insistiu pra comprar um teste,compramos quando chegamos do serviço, mas eu tava confiante que não tinha motivos pra ter alguma coisa. Ele já estava ansioso, perguntava se eu já tinha ido ao banheiro, quando finalmente fui meu mundo caiu, eu desabei.

Não entendia como e nem porque, mas nossas condições não são boas, moramos em uma casa de duas peças nos fundos dos meus pais, não temos nem como fazer um quarto pro meu filho, sonhamos em comprar nossa casa, o serviço novo tinha vindo em boa hora.
Passei duas semanas num inferno, realmente não enxergava mais a luz do dia, entrei em vários sites, procurei clinicas clandestinas, todas absurdamente caras e a maioria em São Paulo ou Manaus se não me engano, continuei procurando, achei os remédios, mandei mensagem pra um monte, uma mulher de São Paulo me respondeu, disse que era confiável, mas todas dizem né?

No desespero que eu tava, resolvi confiar, fiz um depósito bancário no valor de R$ 900,00, foi praticamente meu salário todo, ela demorou pra postar o código, e o medo de ser golpe? Pedi 8 comprimidos, não fazia ideia de quanto tempo eu tava, não quis ir ao médico, não quis fazer eco, imagino se fizesse e ouvisse o coraçãozinho batendo, não sei o que faria, tive medo.

Finalmente os comprimidos chegaram, fiquei o dia todo em jejum, coloquei 6 embaixo da língua e dois lá embaixo, meu marido me ajudou, senti muito, muito frio, calafrios horríveis, acho que dormi umas duas horas só, acordei e nada… começou me bater um pavor tão grande, medo de não ter dado certo, de nascer um bebê com sequelas por minha culpa, umas quatro horas da manhã começou a descer, senti um alivio maior.

Fiquei em casa naquele dia, e minha chefe falou que se eu não fosse trabalhar me colocaria no olho da rua, minha sogra ficou cuidando de mim um pouco, mal conseguia me levantar que sangrava muito.

No dia seguinte, mais recuperada, pedi as contas do emprego, não consegui aguentar a pressão, sangrei por uma semana, quando criei coragem de ir no médico e falar que “achava” que tinha abortado, a doutora só faltou me jurar que não, que era normal, mas me deu uma Eco pra fazer, fiz morrendo de medo de ainda assim ter algo, e enquanto eu ia á caminho, repetia comigo mesmo, não tem nada! não tem nada!

Tinha alguns restos fetais, então á noite eu fui em um hospital público em Porto Alegre, falei o mesmo, que tive um aborto espontâneo, não sabia que estava grávida, fui bem tratada, coletaram um exame de sangue, pois só pela Eco me explicaram que poderia ser um coágulo, e que talvez eu não estivesse grávida, mas mesmo que eu tivesse, não precisaria fazer uma curetagem, pois meu organismo iria se encarregar de expelir o resto.

Juntaram-se umas 8 enfermeiras numa sala para me dar a notícia que realmente tinha sido um aborto, e eu não conseguia nem chorar, só estava com medo de alguém me perguntar alguma coisa, mas ninguém perguntou nada, só falaram que se eu quisesse tentar de novo, era pra esperar uns 3 meses.

Hoje eu continuo tomando pílula e uso camisinha, mas psicologicamente ainda não estou bem recuperada, fazem alguns meses né.

Sim! Nenhum método contraceptivo é 100%, engravidei tomando anticoncepcional, é um absurdo quem diz que só engravida quem quer.

#clandestina75

Branca, 25 anos, São Paulo.

Quando descobri que estava grávida, entrei em desespero. Chorava dia e noite, mal tinha vontade de comer e dormia em qualquer lugar. Descobri a gravidez com o meu namorado que, na hora, me disse que faria o que eu optasse, que eu decidisse sobre meu corpo.
Comecei com chás (todos os possíveis que encontrei) e nada. Comecei a contar para alguns amigos e todos me ofereceram ombro, dinheiro, ajuda.

Todas e todos me indicaram contatos de médicos e pessoas que vendem o remédio. Eu não me sentia segura, pois tinha acabado de acompanhar dois casos gravíssimos de conhecidas que tomaram o remédio. Ao mesmo tempo, eu estava desempregada e não tinha grana pra bancar um procedimento médico.

Por fim, pedi ajuda a um outro amigo, que me levou a outras pessoas e consegui ambos os remédios, de forma segura.

Peguei dinheiro emprestado de um amigo e fui buscar. Tomei o primeiro no mesmo dia e segui os procedimentos conforme explicado. Estava de 7 semanas.

Senti calafrios, enjoo e muito sono. (Também tomei o analgésico liberado). Na primeira dose, expeli. Não sangrei demais, não tive muitas dores além das relatadas. Tive apoio de amigos e namorado 100% do tempo.

Fiquei abalada psicologicamente (sempre quis ser mãe, mas por ser universitária e estar desempregada, não poderia dar o melhor a criança) mas não me arrependo. Não era o momento.

Sou a favor da legalização sim. Acredito que toda mulher possa decidir qual o momento certo e se esse momento realmente existe. Acredito que todo ser mereça ser amado e uma gravidez levada q força é a pior forma de iniciar uma vida.

#clandestina74

Branca, 23 anos, São Paulo.

Quando eu descobri que estava grávida, entrei em choque, sabe quando nunca achamos que vai acontecer conosco? Pois lá estava eu, no banheiro, segurando um teste de gravidez de farmácia com o resultado positivo, chorando sem parar…

Na hora pensei e mandei mensagem para as minhas duas amigas mais próximas, que também são as pessoas que teriam a atitude mais prática e racional em relação a todo esse assunto, elas nem questionaram muito, já tinham certeza do que eu queria fazer, elas são a favor da legalização e tem a mesma opinião que a minha.

No dia seguinte, fiz o exame de sangue, claro pra ter a máxima certeza.. Mas neste resultado, eu nem fiquei mal, pois já tinha certeza. Eu estava de 1 mês.

Então começamos a ir atrás de soluções: uma das minhas amigas conseguiu o remédio (6 misoprostol) 3 dias depois.. nos preparamos, lemos a cartilha da OMS, lemos tudo, milhares de depoimentos de pessoas ao redor do mundo.. nos preparamos muito mesmo.
Eu fiz em jejum (descobri depois que não era necessário). Tomei 3 (deixando dissolver embaixo da língua por 30min), depois de 3h mais 3 (deixando dissolver igual).
Quando eu tomei os 3 primeiros, eu senti dores ABSURDAS logo depois de 15min. Eu achava que ia morrer. Eu chorava muito, era insuportável. Bolsa de água quente não ajudava, deitar não ajudava, nada ajudava. Quando fui tomar a segunda dose, eu já estava tão fraca, que eu devo ter dormido pela fraqueza e pela dor.

Eu acordei no dia seguinte, fui logo olhar no banheiro e tinha um quase nada de sangue.
Bom, fiquei na dúvida. Não sangrei mais, mas como era o primeiro mês, podia ter sido só aquilo..

Eu fiquei com medo de saber a verdade e então, pra fazer o ultrassom e ter certeza do que havia ocorrido, eu deixei passar MUITO tempo (1 MÊS). No fundo eu queria acreditar que tinha dado certo, afinal eu tinha sentido TANTA dor, sofrido tanto.. Não era possível que teria dado errado..

Pois bem, fui fazer o ultrassom… E foi bem pior do que o dia do teste de gravidez…
Lá estava eu, de pernas abertas e o médico dizendo “hey, seu filho está ótimo, olha aqui as perninhas… escuta o coraçãozinho dele”… Meu olho se encheu de lágrima, e mal sabia ele que era de tristeza…

Na hora saí de lá, liguei para minhas amigas de novo e contei aos prantos… Elas me acalmaram e disseram que daríamos um jeito, ainda estacámos em tempo, era meu segundo mês, mas talvez fosse necessário ir a um médico e fazer o procedimento a vácuo, já que o remédio não funcionou.

Eis que no meio de todo este processo, me deparei com alguns anjos, uma médica que me entendeu, me acolheu e não me julgou em momento algum pela minha escolha, muito pelo contrário, me ajudou a fazer com mais segurança e disse que eu poderia tentar o remédio novamente, e me ajudou a chegar ao ‘mifepristona’ (o remédio qual é usado nos países onde o aborto é legalizado, além do ‘misoprostol’).

Pois bem, tomei desta segunda vez 1 mifepristona e 24h depois, o processo foi: 3 misoprostol dissolvidos embaixo da língua por 30min, depois de 3h + 3 misoprostol dissolvidos embaixo da língua.

Porém, desta vez, como eu estava de 2 meses e algumas semanas, eu COM CERTEZA teria de sangrar e ver algum coagulo bem grande.

Daí, o processo aconteceu de novo, minha amiga me ajudou, senti todas aquelas dores de novo… Desta vez eu sangrei um pouco mais.. Mas, NADA… NADINHA, NENHUM COÁGULO…

Daí eu nem entrei mais em pânico, pq afinal o que eu pensava era “sorte a minha que por fim eu achei pessoas tão maravilhosas e humanas que entendem a minha opinião e escolha, eu estou saudável.. e por fim, eu ainda estou em tempo…”

Só que desta vez o que pensei também foi que já iria dar 3 meses, eu já tinha tentado o remédio 2 vezes e não tinha dado certo, então só me restava o procedimento a vácuo…
Eis que um desses anjos acolhedores me explicou que eu ainda poderia tentar mais uma vez, talvez fosse só a quantidade de remédio que meu organismo precisasse de um pouco a mais… daí a decisão seria minha, afinal todo esse processo de dor também é muito sofrido. Mas eu também precisava decidir muito rápido, os 3 meses já haviam batido na porta, cada dia que passasse, era mais complicado.

Eu decidi tentar a última vez o remédio, era realmente minha última tentativa mesmo.
Desta vez foi: 1 mifepristona, 36h depois: 4 misoprostol dissolvidos embaixo da língua, 2h depois mais 2, 2h depois mais 2.

Eis que: desta vez foi tudo muito diferente! Pela primeira vez, tomando uma quantidade maior logo de cara, eu não senti nada de dor, nadinha… passaram 2h e nada de dor…

Tomei a segunda dose e 1h depois veio a dor insuportável… MUITO INSUPORTÁVEL MESMO. Desta vez, eu fiquei embaixo do chuveiro, a agua quente ajudou a aliviar um pouco a dor, mas muito pouco… Eu sentava, levantava, chorava… mas a dor não passava…
Quando perto de tomar a terceira dose, eu tentei deitar, mas não consegui, parece que era pior… Entao eu decidi sentar no vaso, quando ouvi um “PLOC”.

Veio uma avalanche de sangue/coágulo/alívio de dor, eu olhei e vi, como já estava avançado, era visível…Finalmente havia acabado. O maior alívio da minha vida!
Fiquei sangrando consideravelmente bastante por alguns bons dias… bastante mesmo nos 5 primeiros…

No terceiro, algo atípico aconteceu, estava no trabalho e comecei a sentir dores.. tipo de infecção urinária, o cheiro tava terrível.. tava tudo insuportável… mandei mensagem pra minha amiga e disse que estava preocupada, ela me aconselhou a esperar até o final do dia (eu estava no trabalho), se não passasse, falaríamos com a médica. Ok, resolvi esperar, mas só piorava. Até que no fim da tarde fui ao banheiro, tentei fazer xixi e não saia, sentia muita dor… quando fui me limpar, senti algo gosmento preso que não saia.. então, resolvi puxar… fiz muita força e saiu algo um negócio de uns 10cm, todo gosmento, que parecia um fígado, cheio de sangue, fedendo. Nesse momento eu entrei em choque, mas senti um alívio, pois a dor passou na hora… Era a minha placenta.

Depois disso vieram uns coágulos enormes, eu fiquei meio fraca…

Esperei uma semana e finalmente fiz meu ÚLTIMO ULTRASSOM. Tudo perfeito! Levei até a médica, tivemos uma conversa sobre todo o processo… E apesar de todo o processo, eu estava ótima, feliz e aliviada. E me sinto privilegiada. Em momento algum eu tive dúvida sobre ter ou não ter, acho que isso foi muito importante em toda essa “jornada” que eu passei.

Agora, mais que nunca eu sinto uma revolta ainda maior pelo aborto ainda ser ilegal. Eu tive a imensa sorte de ter pessoas incríveis ao meu alcance, que puderam me ajudar num processo que foi extremamente complicado e eu imagino a maioria de todas as pessoas que nem ao menos se quer tem a chance de ter essa escolha pela falta de opção ou informação, ou até mesmo acabam escolhendo métodos que se tornam muitas vezes arriscados para a própria vida, por serem vendidos ou feitos de forma ilegais.