#clandestina79

Negra, 36 anos, Salvador (BA)

Parece que ainda estou num pesadelo. Nunca imaginei que um dia faria um aborto. Até que me vi numa situação desesperadora, onde pela primeira vez senti vontade de tirar a minha vida. 10 anos de casada, uma filha linda de 4 anos e um marido super parceiro. Vida estável, família cristã, onde o aborto é um pecado grave e abominável. No meio da calmaria, cometi o deslize, o único nesses dez anos de casada: transei com um amigo. A curiosidade de um sexo diferente me atiçou como nunca antes e um mês depois lá estava eu grávida.

Nos primeiros dois meses eu me sentia tão fraca e debilitada que em nenhum momento pensei q essa criança não poderia ser do meu marido. Ao final da 12 semana, quado tive minhas forças renovadas, me abateu uma depressão e a certeza de que essa criança não era do meu marido. Me sentia suja, injusta, como poderia estar fazendo isso? Enganando a todos, enganando meu marido, minha família. E essa criança? Até quando viveria em meio à mentira sobre a sua paternidade? Essas questões estavam me levando a loucura. Certo dia, dirigindo, senti vontade de jogar o meu carro do viaduto para acabar com aquele sofrimento mental. Foi quando pela primeira vez pensei em aborto. Eu não conhecia ninguém que já tivesse feito ou nenhuma clínica clandestina… eu não conhecia nada!

Comecei a pesquisar na internet e cheguei a um contato de uma enfermeira que cobrou 4 mil pelo procedimento. Eu estava desesperada. Peguei um empréstimo e fui até a residência desta pessoa. O procedimento iniciou com injeções no soro de ocitocina e introdução uterina de dilatadores. Tudo foi muito doloroso. Durou um dia inteiro e a expulsão do feto aconteceu em casa. Para todos foi um aborto espontâneo. Me dirigi em seguida para um hospital que fez a curetagem. Em nenhum momento mencionaram que o aborto foi provocado. Fiquei internada 2 dias e tomando antibióticos em casa. Não tive hemorragias. Senti um pouco de cólicas por alguns dias. A dor emocional é destruidora. Todos sabiam que eu estava grávida…então ouço: “Deus quis assim”. Não. Ele não quis assim. Eu escolhi esse caminho e que não terá volta. Tenho vergonha de fazer orações, tenho vergonha de olhar para as pessoas, tenho vergonha de mim mesma. Estou deprimida e só queria poder voltar ao passado e não ter tido aquela transa maldita. Será que um dia Deus vai me perdoar? Será que vou me perdoar? Quero me preparar pra engravidar novamente, só que do meu marido, do meu parceiro. Aventuras, nunca mais!