#clandestina86

Negra, 22 anos, ABC (SP).

Bom, eu descobri que estava grávida bem rápido, eu estava de três semanas mas mesmo sendo pouco tempo eu fiquei desesperada. Eu nunca quis ser mãe, eu estava em um relacionamento abusivo a seis anos, e dez meses tinha acabado de conseguir uma bolsa na faculdade. Estava no primeiro semestre e pronta pra sair desse relacionamento.

Quando eu vi o resultado do teste, me senti sozinha e presa mais uma vez à relação que não estava me fazendo nada bem. O meu parceiro já tinha uma filha de outra relação, e ele era um péssimo pai. Eu, vivendo tudo isso, resolvi abortar sozinha, escondido dele porque eu não confiava nele, tinha medo que ele contasse para os meus pais, que nunca aceitariam, e comecei loucamente a procurar alguém que me vendesse os remédios. Encontrei várias pessoas horríveis que fazem do seu sofrimento e desespero um comércio e queriam me vender a quantidade errada de remédios para a quantidade de semanas que eu estava, por valores absurdos. Foi quando eu consegui entrar em contato com uma moça de um coletivo de mulheres que foi um anjo na minha vida, me ajudou, tirou todas minhas dúvidas, me deu a quantidade correta dos remédios, me explicou todo o procedimento sem nenhum tipo de julgamento e salvou minha vida. O meu processo foi muito tranquilo, não senti dor nenhuma, apenas um leve desconforto, não precisei ir para hospital nem nada e tive ainda mas força para sair daquela relação que só me destruía todos os dias.

Acredito que a única pessoa que pode decidir o que vai acontecer na vida dela é a própria pessoa, mesmo porque as consequências boas ou ruins nestes casos são individuais, então porque um terceiro tem que me dizer o que fazer com minha vida e meu corpo? Também por acreditar que o aborto não é legal por uma questão de gênero: se ao invés das mulheres, a responsabilidade de gerar a vida fosse dos homens, já seria legal há tempos! E acho que gerar uma vida precisa ser uma coisa que você queira genuinamente e que seja feita com responsabilidade para essa criança e depois adulto ter todo suporte carinho e amor que todos nós merecemos. E entendo que nem todas as mulher querem ser mães e isso não é uma obrigação, não vai nos fazer menos mulher. E, principalmente, erros acontecem e mulher não deve ter a maternidade como punição.