#clandestina39

Vou contar minhas duas experiências de aborto. Na primeira vez eu tinha dezesseis anos como uma adolescente comum achava que nada me atingiria nem doenças muitos menos uma gestação por isso não me prevenia com nenhum método anticonceptivo, não tinha muitos parceiros, era um namorado mesmo e esse também venho a ser o pai dos meus dois filhos.

Eu ainda cursava o 2º ano do ensino médio quando me dei conta que meus seios aumentaram do dia para a noite quando meu namorado pontuou isso me dei conta de que minha menstruação estava atrasada logo começamos a pensar em estratégias para conseguir interromper a gestação. Em momento algum pensamos em manter, já que ambos adolescentes inconsequentes não teríamos a mínima condição de nos manter e manter outro ser que seria completamente dependente de nós.

Ele iniciou a busca pela famosa medicação Cytotec, nem sei se é assim que se escreve, logo um amigo dele indicou um farmacêutico que claro para efetivar a venda marcou em um local no qual não se comprometeria. Na época, no ano de 99, o valor era de R$ 400 reais em quatro comprimidos lá mesmo ele deu as dicas de como utilizar a medicação ao meu namorado já que eu estava escondida no carro me sentido uma criminosa que poderia ser pega em delito a qualquer momento. Eu deveria introduzir dois na vagina e tomar dois via oral, naquela mesma noite fiz o procedimento.

Após 5 horas comecei a ter fortes contrações e a bolsa se rompeu fiz todo esse processo com meus pais dormindo no quarto ao lado e meus irmãos no outro ninguém desconfiou de nada porque segurei à vontade chorar o tempo todo. As dores persistiram por mais de duas horas após isso quando senti a necessidade de ir ao banheiro quando sentei no vaso caiu tudo acho q estava aproximadamente com um mês porque só tinha uma bola de sangue lá mesmo.

Dei descarga e fui tomar banho já que eu sangrava muito, muito mesmo, rapidamente troquei os meus lençóis e no primeiro horário da manhã lavei minhas roupas pessoais e de cama, pronto ali havia se acabado tudo sangrei por um mês direto sem ir ao médico ou falar para mais alguém fora meu namorado.

Já a segunda experiência foi há exatos oito meses, num momento extremamente diferente da minha vida. Hoje tenho dois filhos uma menina de 15 anos e um menino com 12, deixei aquele meu namorado que venho a se tornar meu marido com o qual vivi doze anos num casamento que não havia sido o que eu sonhei para mim muito pelo contrário só fez me sentir diminuída e inferiorizada, mas dei a volta por cima e me divorciei, após uma traição.

No mês seguinte iniciei a faculdade e comecei a mudar a minha trajetória de vida, minha e dos meus filhos, já uma mulher extremamente preocupada e coerente na medida do possível claro. Fui ter relação novamente dois anos após o divórcio, iniciei novamente o uso do anticoncepcional e mesmo assim usando sempre o preservativo já que o medo de jogar tudo que havia conquistado fora era muito grande, mais de nada tudo isso adiantou.

Aqueles 1% que só acontece com você aconteceu comigo acho q devido uma infecção de garganta a medicação falhou e a camisinha não sei como também. Fiquei revoltada e indignada porque diferente da minha adolescência eu estava me prevenindo de verdade comecei a ver o quanto eu não tinha o direito de decidir se queria ou não ser mãe novamente já que meu corpo decidiu por mim.

Na mesma hora em que fiz o exame de urina deu positivo mandei uma mensagem para minha melhor amiga que venho na mesma hora ao meu encontro e iniciamos a procura por métodos para interromper a gestação não cabia novamente neste momento uma criança na minha vida cursando o penúltimo semestre da faculdade mantendo a mim e aos meus filhos não me via começando tudo de novo e sozinha.

Fiquei um mês me intoxicando com todos os tipos de chás que lia na internet e nada do sangramento vim o exame de sangue também já havia confirmado a gestação e minha amiga sempre ao meu lado buscando informação. Enfim ela conseguiu contatos de duas ONGs feministas uma internacional a qual escrevi e não recebi a medicação porque tive medo de enviar o dinheiro e ser um golpe, a outra eu mesma entrei em contato após um primeiro contato no qual eu estava extremamente despreparada para falar não consegui o que desejava.

Uma semana depois e já tendo que assumir a gestação indesejada tive uma notícia da minha amiga que eu deveria novamente entrar em contato mais com uma abordagem diferente o desespero era tanto que marquei o encontro com muito medo ainda já que continuava me sentindo a criminosa da primeira vez por ter que fazer tudo escondido.

O encontro foi totalmente diferente do que aconteceu na minha adolescência me senti acolhida com o passar da conversa e de todos esclarecimentos minha amiga estava ao meu lado o tempo todo, aquela pessoa que até então era apenas uma desconhecida que não sabia o porquê estava disposta a me ajudar por compreender todo esse processo pelo qual eu estava passando e pelo qual várias mulheres passaram e ainda vão passar.

Me explicou duas opções aquela na qual eu não teria acesso que seria a clínica particular na qual ao meu ver só as mulheres com dinheiro tem acesso e essas tem sua solução em mais ou menos uma hora da entrada até a saída e o outro método o das medicações que eram duas método também seguro e mais acessível no fim da conversa ela me passou a medicação sem saber se eu colaboraria ou não com a ajuda em dinheiro que não foi estipulado e sim falado que se eu pudesse ajudar com várias outras mulheres que viriam a passar pela mesma situação que eu fizesse um deposito seguro.

Sem acreditar no que estava acontecendo aceitei e já me articulei para fazer o uso da medicação, novamente minha amiga ao meu lado eu já estava indo pra sexta semana de gestação e tudo ocorreu como o processo explicado por ela a dor desta vez foi muito mais suportável e depois de iniciado o processo que se dividia em duas etapas e com medicações casadas cerca de 3 a 4 horas da segunda parte do processo medicamentoso e sem nenhum risco abortei sangrei muito também na primeira hora mais depois segui todo o processo de cuidados indicado em conversa.

Fui ao médico depois de 15 dias fiz exame e estava tudo bem, mas hoje ainda penso em tudo que aconteceu e que eu só estarei livre do risco de ser mãe novamente se fizer algum método irreversível já que todos métodos de prevenção não são 100% seguros e eu sempre posso correr o risco de ser o 1%.