#clandestina42

Eu e meu companheiro sempre nos protegemos. Na troca de anticoncepcional, obedeci as orientações da ginecologista que me afirmou que eu estaria protegida e não teria nenhum problema. Comecei a sentir enjoo e logo desconfiei. O teste de gravidez da farmácia me trouxe a certeza.

Fiquei desesperada. Uma gravidez representa uma mudança radical de vida e não estava disposta naquele momento. Ocupava um cargo de chefia, estou terminando de me graduar e meu marido já tem uma filha. Seria muito difícil levar adiante uma gestação. Tomamos a decisão juntos e para mim foi o melhor a ser feito.

Uma amiga que já tinha feito me passou o contato de uma moça que vendia os comprimidos de Cytotec. Buscamos o remédio e as orientações sobre o procedimento, tive muito medo por todos os riscos que corri, inclusive o de perder minha vida. Desejo ser mãe, mas não sem formação e sem estabilidade financeira.

O procedimento ocorreu de forma tranquila, tive algumas dores e muita perda de sangue o que me causou um principio de anemia. Na volta à ginecologista fiquei com medo de contar a verdade, pois não sabia se havia resquícios. Fiquei desconfiada que ela pudesse descobrir algo que eu não quisesse. É muito difícil lidar com os profissionais da saúde, especialmente nesse tema, não temos controle sobre nosso corpo e o aborto é muito criminalizado.

É exatamente essa ilegalidade sustenta um mercado “paralelo” no qual médicos e a indústria farmacêutica ganham muito dinheiro. O aborto é uma questão de classe econômica também, paguei R$ 1 mil pelos comprimidos, eu tinha o dinheiro, quem não tem não faz ou faz em condições insalubres e corre risco de vida. Ser militante feminista me ajudou muito nesse processo, ter a compreensão que não somos apenas um saco gestacional e que temos direito escolher sobre sermos mães ou não foi decisório.