#clandestina65

Branca, 26 anos, São Paulo (SP)

Quando eu engravidei do meu primeiro filho claramente não queria assumir aquela gravidez naquele momento. Eu e meu namorado na época estávamos juntos há nem 1 ano. Ele não trabalhava e eu ganhava uma miséria como recém formada.
Minha prima já havia passado por um procedimento, mas ela mal lembrava onde era, apenas o bairro. Fomos para aqueles lados algumas vezes, entramos até em consultórios errados, mas não encontramos. Foi aí que ela lembrou que conseguiu o contato em uma ong que defendia os direitos da mulher.

Eu logo pensei que seria fácil, mas quando fui procurar descobri várias e muitas delas não queriam nem falar comigo com medo de que eu as comprometesse de alguma forma. Não desisti, não queria ter aquele filho. Bati na porta de uma das ongs e elas me acolheram e me deram o telefone do médico. Liguei, marquei e fui.
Quando fizemos o ultrasom descobrimos: 18 semanas!

O médico disse que teria como fazer sim, era uma clinica boa e isso me custaria muito dinheiro, quase o preço de um parto, já que teria que passar por um cirurgia e um pernoite na clinica. Não consegui seguir com o procedimento. Seria dolorido e além disso não ia conseguir arrumar aquele dinheiro todo. O meu namorado na época surtou quando eu disse que não ia seguir em diante, que teria aquele filho. Tinha uma relação bem abusiva.

Meu filho nasceu e nossa relação só piorou, eu sendo cada vez mais mal tratada. Já não o amava mais, nem tesão tinha por ele. Após o nascimento do nosso filho transamos 3 vezes em 1 ano e meio. Um dia, depois de muita insistência, transamos. Pedi muito para que ele não gozasse dentro e ele prometeu que não faria isso, mas ele fez.

Quando minha menstruação atrasou já sabia e o primeiro sentimento foi medo. Medo do que os outros iriam me falar, medo de assumir de novo uma responsabilidade sozinha e medo dele, que falava para todos que se eu aparecesse grávida não seria dele, já que nem transávamos. Surtei por uma semana. Sabia o que tinha que fazer mas não ia ter dinheiro.

Falei com uma única amiga, que me acompanhou nas consultas. A primeira fui em outro médico, não no que eu tinha ido a primeira vez. Achei que ele poderia ser mais barato. O consultório dele era horrível, havia uma cabine como aquelas de casa de câmbio para falar com a recepcionista. Entramos na consulta e ele logo fez um terror, disse que eu estava fazendo algo contra a lei, que poderia ser presa e que se eu falasse algo para alguém daquele consultório eu seria a maior prejudicada.
Teve exame de toque e logo após o valor do procedimento e agenda para ver quando eu poderia fazer.

Minha amiga pediu para me acompanhar e ele disse que durante o procedimento ela teria que dar uma “voltinha” na rua, ela retrucou que não me deixaria sozinha e sedada lá. Saímos e o conforto com aquele local foi zero. Liguei e marquei consulta no outro, o primeiro que fui. Chegando lá expliquei a situação, ele me passou o valor (dinheiro que eu não tinha) e marcamos para a outra semana.

Essa minha amiga conseguiu um empréstimo para mim. O valor deveria ser pago em dinheiro. Chegamos no dia e na hora marcada, fomos recebidas e encaminhadas para um quarto individual, onde eu tive um pequeno preparo antes. Minha amiga ficou lá e eu fui conduzida a uma bela sala, quase que um centro cirúrgico. Fui anestesiada na veia e não vi mais nada. Acordei novamente neste quarto que minha amiga me esperava. Vomitei muito.

Dois detalhes:
O médico que fez o procedimento nos falou que o médico anterior havia entrado em contato com ele dizendo que eu iria até lá e que ele não deveria fazer o meu procedimento porque eu ia ferrar com a vida dele. O meu namorado na época nunca ficou sabendo de nada.Paguei por esse procedimento, sozinha, por dois anos.

Sou a favor do aborto, pois pais abortam todos os dias. Não são julgados moralmente e nem judicialmente. A “pena” mais dura para eles é que talvez tenham que pagar um salário mínimo como pensão, isso claro depois das mulheres terem sido humilhadas, julgadas e desgastadas emocionalmente.

Hoje tenho 2 filhos. Um de 6 e outro de 2 anos e 8 meses.