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#clandestina80

Branca, 31 anos, Ceará.

Antes de explicar o procedimento, a dolorosa experiência de fazer um aborto é importante falar sobre os motivos pelos quais uma mulher decide fazê-lo. Pra quem nunca passou pela situação, acha que é fácil! Não é! Decidir, fazer, superar… É doloroso!

Eu fui mãe aos 16 anos. E depois aos 29 anos.
Nao “planejei” meus dois filhos, mas os amei desde que soube que estava gerando-os. Romantizei a maternidade e não tive medo!! Nunca me passou pela cabeça a possibilidade de abortar!

Na primeira vez, engravidei num flash back com o ex namorado que já havia morado comigo na casa dos meus pais! Eu achei um sonho! Os hormônios alterados e junto aos enjôos, enjoei também o pai do bebê e não queria vê-lo pintado de ouro! Diziam que quando nascesse, eu voltaria a amá-lo! Engano! Minha mãe muitas vezes usava a criança pra me obrigar a fazer tudo do jeito dela. Como não cuidar dele pra eu ir a escola se eu não fizesse absolutamente tudo como ela ditava.

Cursei ensino médio levando meu filho com 2 anos pra aula… Depois parei porque ele já estava grandinho e atrapalhava a aula. Quando retornei, finalmente concluí o ensino médio aos 22 anos! Isso é apenas uma pincelada dos percalços da minha primeira maternidade!

Anos depois, casada, morando de aluguel, com um filho de 12 anos, desempregada e o marido também, cursando o último ano de faculdade… Grávida! Chorei. Não queria mais filhos! Mas eu não podia tomar anticoncepcional, pois alterava muito os meus hormônios e eu fazia tratamento pra depressão, e os anticoncepcionais só pioravam o quadro. Laqueadura tava fora de questão pelo SUS por conta da idade, e particular eu não tinha dinheiro. DIU, na minha cidade, não é fácil colocar pelo SUS também… Enfim, me restava camisinha.

Optei mesmo pelo anticoncepcional, mas esqueci por 3 dias seguidos. Totalmente. Bucho! Chorei. Aceitei. Amei. Sabia que abriria mão de muita coisa… Mas tudo bem! Pra algumas pessoas, gravidez não é doença, certo? Pra mim é! Todos os sintomas! Fico de cama. Vomito até ferir o esôfago. Emagreço. Desidrato. Não tenho ânimo pra NADA. Fico acamada. Era tchau, faculdade. Minha mãe ficou cuidando do mais velho que já tinha 12 anos e não dava trabalho e de mim que precisaria ser cuidada como bebê por alguns meses.

O marido? Enjoei também! Mas não me separei. A separação veio 3 anos depois, quando a bebê já tinha 3 anos e eu me sentia mais tranquila pra voltar a trabalhar!

Dado esse contexto prévio, vamos ao contexto no qual eu vivia quando me descobri grávida pela terceira vez:

Separada, 2 filhos, trabalhando 10 horas por dia por 1 salário (no dia que confirmei o exame de sangue foi o dia que assinei o aviso prévio na empresa – sintam o drama!), pagando aluguel que leva metade do salário, e “saindo” (não era um namoro) com um rapaz 6 anos mais novo, desempregado e amigo do meu ex marido!

Imagina toda a condenação que eu passaria numa cidade pequena! Piadas, comentários maldosos… Calúnias de que eu havia me envolvido com um amigo dele antes da separação…3 filhos: 1 de cada pai! Mas isso seriam apenas o falatório, certo? Eu poderia ignorar!

Vamos ver meu lado financeiro: não dava! Não tinha como! Eu estava sendo demitida… Poderia pedir reintegração, tá previsto em lei… Mas em uma empresa pequena, trabalhar grávida com quem não te quer por perto… É pedir pra viver um turbilhão de choros! 8 dias após minha demissão fui chamada pra outro trabalho, o salário seria o mesmo… Se eu contasse que tava grávida, me dispensariam pra eu ser reintegrada ao emprego anterior. O que eu não podia fazer.

Meu lado emocional: Eu mal dou conta de 2 filhos. O que eu poderia oferecer àquele inocente? Mas teria o pai pra ajudar, certo? ERRADO, porque eu não conseguia olhar na cara dele! Não conseguia conversar com ele. Eu enjoei ele. Era visceral.

Passava o dia mal, com enjoos, com fome (porque nada me entrava) e não pedia ajuda a ele pra não ter que vê-lo. Ele não tinha culpa, e se revelou o homem mais forte que já conheci em toda a vida, pois, apesar de toda a minha repulsa, ele estava ali, disponível, atencioso, fazendo de tudo pra tornar a minha dor suportável. Não tentou me convencer a ter a criança, pois via o quanto aquilo era doloroso pra mim!

Meu lado físico: eu não conseguiria gestar novamente faltando semanas para comentar 32 anos. Trabalhar pra sustentar a casa, acompanhar a rotina de um filho adolescente, cuidar de uma criança de 3 anos, com todos os vômitos, enjoos, sem suportar o pai da gravidez por perto?

Como eu poderia retornar a faculdade? A caçula havia saído da mama há 2 meses e eu tava planejando voltar a faculdade em 2019… Seria impossível.

Eu imaginava como seria quando o bebê nascesse, levar a de 3 anos pra escola… De bike, mochilas, cadeirinha… E um bebê? Cada detalhe era inviável!

Cogitei ter e doar! Não conseguiria. Eu tinha certeza que na hora que pusesse meus olhos eu o amaria e enfrentaria qualquer privação ou dificuldade por ele. Jamais conseguiria imaginar que havia um filho por aí, em algum lugar, sem saber se ele estava bem ou não!
Pensei em dar ao pai… Mas como eu faria isso? Como eu viveria sabendo que uma pobre criança iria crescer com o sentimento de ter sido abandonada pela mãe? Eu o amaria demais pra permitir que ele se sentisse assim!

Como engravidei?
Já disse que não posso tomar anticoncepcional e quando tentei minha cabeça de vento esqueceu e eu engravidei, certo? Nada de bobeira agora! CAMISINHA! A camisinha não estourou… Ela escapuliu pra dentro e não vimos! Só no fim percebemos o que havia acontecido e às 7h da manhã estava tomando uma pílula do dia seguinte… Porém, eu não sabia que antibióticos corta o efeito da pílula do dia seguinte e eu estava em tratamento pra faringite!

Atrasou, fiz teste de farmácia. Positivo! Fiz outro: positivo! Fiz o de sangue: NEGATIVO!
AMÉM. Pode ser ao alteração hormonal por causa da pílula. Comecei a sentir dores… E o atraso …. Opa, pode ser algum problema. Vamos a transvaginal… O médico pediu exame de sangue, pois havia um coágulo que parecia gestação de 4 semanas. Gelei!
Fiz o de sangue: positivo!

Passei na empresa, assinei o aviso e fui pra casa! Liguei pro rapaz e ele veio. Me achou na cama, aos prantos com o exame na mão. Aquilo destruiu ele por dentro! Ele me amava e queria um filho comigo… Mas uma gravidez naquele momento, só me trazia dor e desespero! Ele disse que me apoiaria em qualquer que fosse minha decisão.

Falei com um casal de amigos, que através de bons contatos conseguiram 6 comprimidos de misoprostol por um preço razoável. Ele pagou. Fui pra casa de uma amiga! Medo de morrer! De deixar meus filhos. De passar mal e no hospital ser presa! Muito medo.
Coloquei 4 sob a língua. 3 horas depois os outros 2.

O sangramento começou com algumas cólicas. E só. Pouco sangue, poucas cólicas! 5 dias depois, outro ultrassom com a desculpa de estar preocupada! Médico falou que haviam poucas chances do embrião avançar, que eu me preparasse e refizesse o exame em 10 dias. Alguma má formação estava sendo rejeitada pelo corpo e por isso a ameaça de aborto espontâneo!

10 dias depois voltei! Estava com 6 semanas! Ouvimos o coração! O médico comemorou um embrião forte. Perguntei se o primeiro sangramento poderia ter deixado sequelas, ele disse que só daria pra saber com 25 semanas! Agora era uma questão de concluir! Não poderia deixar ele nascer com riscos de imperfeições por uma atitude minha.

Fui orientada que a quantidade havia sido pouca e fiz uma nova encomenda com um fornecedor diferente… 12 comprimidos. Bem mais caros! Ele pagou novamente. Desempregado, mas conseguia o dinheiro! Certamente seria confiável dessa vez…
Fui pra casa do “namorado” mal olhando ou conversando com ele. 4 sob a língua e 2 introduzido. 3 horas depois mais 4 sob a língua… Nada de dores, ou sangramento… Fui trabalhar. Tive uma forte enxaqueca e fui pra minha mãe. Vomitei.
Fiquei bem.

Não era possível! Segunda tentativa e não dava certo! Minha mãe descobriu nesse dia que estava grávida! Não falei que já havia tentado abortar, mas falei que não teria a criança! Ela tentou me dissuadir, mas não permiti que ela falasse. Não permitia que ninguém ousasse me dissuadir, porque ninguém me ajudaria a cuidar! Apenas o pai… Eu sabia que ele me ajudaria. Mas nós, mães, sabemos como é… Por melhor que seja, o maior peso e maiores abdicações são as nossas!

Essa pessoa que me vendeu os 12 me indicou um farmacêutico que manipula um gel e traria outros comprimidos de outro laboratório. Não haveria erro. Caros! E eu com medo.
Esse farmacêutico conseguiu, a meu pedido, uma médica: 5 mil reais. Era inviável! Eu preferia o procedimento clínico pra não ter mais erros. Mas nem vendendo a moto dele daria esse dinheiro todo.

Lembrei de uma amiga, feminista e que com certeza saberia onde me indicar algo certo! Fui. Aliás, fomos. Ele sempre comigo apesar da minha rispidez.

Ela me explicou que conseguiria gratuitamente, a menos que eu quisesse contribuir. Alertou-me dos perigos de ser presa. E combinamos um código pra conversar sobre o assunto.

Demorou algumas semanas e eu desesperada! No dia que o farmacêutico me liga, cobrando os olhos da cara, ela também me liga pra dizer que conseguiu. Ufa!

Fiz mais uma ultrassom. 10 semanas! Ouvi o coração dele. Foi devastador! Pois eu sabia o que eu faria… Nunca permiti que ele fosse aos exames comigo. Tinha medo dele se apaixonar pelo nosso pequeno projetinho de filho… Se ele tivesse lá naquele momento, teria implorado pra eu não abortar!

Fomos pegar a encomenda com a minha amiga! Faltei trabalho, e fui pra casa dele!

Tomei 4 sublingual. Nada de introduzir. 3 horas depois começaram as cólicas e já era hora de mais 4 sublingual. Quando as cólicas começaram, começou uma sensação de febre… E diarreia! Muito líquida! E amarelo-esverdeada. E vômitos. E calafrios. As dores eram contrações. Eu as conhecia bem. Tive 2 partos normais. Mas eram contrações apenas no pé da barriga… Muito fortes. Desisti de ficar voltando pra cama e fiquei sentada no vaso, agarrada na mão dele… Ele foi pegar água de coco pra mim e eu agarrava na pia do banheiro. Doía muito! Mas eu sabia que tava funcionando! Medo de morrer ali! Medo de ir pro hospital e descobrirem! De ser presa. E por mais que ele estivesse comigo, a sensação de solidão é enorme… Porque é algo que ninguém pode viver por você.

Depois de muita diarreia e vômitos, voltei a cama, nua, sem calcinha, coloquei um absorvente grande e um lençol forrando a cama. Deitei! Ele segurava a minha mão! Eu tinha dor e medo. Senti uma vibração no útero e segundos depois um PLOC… Tomei um susto. Ele me ajudou a levantar e ir ao banheiro. O lençol ficou ensopado de água e quando levantei, desceu sangue no absorvente…

Sentei no vaso e veio mais sangue. Quando tentei levantar, vi o embrião saindo. Travei. Em choque. Não queria que ele também visse. Não queria esse trauma pra nós dois. Mas vimos. E a sensação até agora… As palavras que não paro de ouvir na minha cabeça é: “DEIXEI UM FILHO NO VASO”.

Ele ajudou a tirar, eu de olhos fechados… Me ajudou a me banhar e me levou pra cama. Toda dor passou. A sensação de febre e os calafrios. Ele foi comprar ibuprofeno e eu fiquei sozinha.  Outra cólica e eu fui ao vaso: a placenta! E muitos coágulos de sangue. Foi um parto. Todas as etapas de um parto. Mas eu não levei o bebê pra casa… No dia seguinte estava trabalhando.

Sangrei forte com muitas cólicas por uns 5 dias. Depois diminuiu. Fui a uma médica de minha confiança com 15 dias. Contei tudo. Fizemos outra transvaginal e ela garantiu que estava tudo certo. Sem riscos de infeção e que eu menstruaria por mais uns 15 dias.
20 dias após o procedimento eu menstruei novamente e com muitas cólicas. Mas tudo normal.

Com o rapaz… Bem, o enjôo passou e me vi apaixonada por ele novamente, no entanto, o mais correto era terminar e cada um pro seu lado. Eu me sinto muito grata por todo apoio que tive dele e admiro seu caráter e força. Não foi fácil o que vivemos.

Não me sinto arrependida. Apenas culpada! Culpada por não ter amado aquele bebezinho desde o primeiro instante! Por ter sido egoísta… Mas, acredito que a decisão foi boa pra ele também! É melhor não vir a esse mundo! Foi uma decisão boa pros meus filhos que terão uma mãe com maior disponibilidade de correr atrás de seus objetivos e uma melhor vida pra eles! Foi melhor pro pai que não está preso a uma mulher e um filho não planejados e pode tocar sua vida!

Eu me sinto livre novamente! E feliz! Com esperança! Posso planejar… Me sinto forte pra lutar! Consigo levantar, comer, conversar, sorrir… Foram 7 semanas de terror desde que descobri a gravidez até o aborto. Escondendo. Disfarçando. Pensando nos prós e contras. Com medo de não conseguir interromper! Foi um pesadelo! Um longo pesadelo! Apesar de parecer uma nova chance pra mim… Dói. Dói muito! Trabalho minha mente pra me perdoar e aceitar que foi sim a melhor opção!

E sou grata a todas as pessoas que me ajudaram. Me apoiaram. Não me julgaram. Pessoas que me amam e que se pudessem, teriam sentido tudo no meu lugar por alguns dias, pra me dar uma pausa, um alívio… Gratidão! 13 dias após o aborto, completei 32 anos e eles fizeram a surpresa mais linda: um bolo de mulher maravilha!

Agora, tô mais decidida que nunca: quero a minha laqueadura! Espero nunca mais passar por isso! E sabe a minha fé? Continua igual! O meu Deus? Continua me amando! Ele sabe das minhas limitações… E, se Ele não aprova o que eu fiz… mas não deixou me amar por isso! Sou evangélica.

Sou a favor da legalização do aborto! Sempre fui! Sempre imaginei que EU jamais faria! Jamais precisaria! Mas sempre tive empatia por mulheres que não queriam ser mães e acabaram engravidando… Até mesmo por dó da criança! O mundo já é tão injusto, imagina vir a esse mundo onde nem a mãe desejou essa criança!
As pessoas são rápidas em julgar as abortistas, mas essas mesmas pessoas não vão ajudar com uma lata de leite, nem um pacote de fraldas ou uma noite cuidando de um bebê pra mãe descansar ou trabalhar, ou estudar…
As mais rápidas na hora de criminalizar o aborto são as mais rápidas em declarar “quem pariu os mais teus que balance”!

#clandestina79

Negra, 36 anos, Salvador (BA)

Parece que ainda estou num pesadelo. Nunca imaginei que um dia faria um aborto. Até que me vi numa situação desesperadora, onde pela primeira vez senti vontade de tirar a minha vida. 10 anos de casada, uma filha linda de 4 anos e um marido super parceiro. Vida estável, família cristã, onde o aborto é um pecado grave e abominável. No meio da calmaria, cometi o deslize, o único nesses dez anos de casada: transei com um amigo. A curiosidade de um sexo diferente me atiçou como nunca antes e um mês depois lá estava eu grávida.

Nos primeiros dois meses eu me sentia tão fraca e debilitada que em nenhum momento pensei q essa criança não poderia ser do meu marido. Ao final da 12 semana, quado tive minhas forças renovadas, me abateu uma depressão e a certeza de que essa criança não era do meu marido. Me sentia suja, injusta, como poderia estar fazendo isso? Enganando a todos, enganando meu marido, minha família. E essa criança? Até quando viveria em meio à mentira sobre a sua paternidade? Essas questões estavam me levando a loucura. Certo dia, dirigindo, senti vontade de jogar o meu carro do viaduto para acabar com aquele sofrimento mental. Foi quando pela primeira vez pensei em aborto. Eu não conhecia ninguém que já tivesse feito ou nenhuma clínica clandestina… eu não conhecia nada!

Comecei a pesquisar na internet e cheguei a um contato de uma enfermeira que cobrou 4 mil pelo procedimento. Eu estava desesperada. Peguei um empréstimo e fui até a residência desta pessoa. O procedimento iniciou com injeções no soro de ocitocina e introdução uterina de dilatadores. Tudo foi muito doloroso. Durou um dia inteiro e a expulsão do feto aconteceu em casa. Para todos foi um aborto espontâneo. Me dirigi em seguida para um hospital que fez a curetagem. Em nenhum momento mencionaram que o aborto foi provocado. Fiquei internada 2 dias e tomando antibióticos em casa. Não tive hemorragias. Senti um pouco de cólicas por alguns dias. A dor emocional é destruidora. Todos sabiam que eu estava grávida…então ouço: “Deus quis assim”. Não. Ele não quis assim. Eu escolhi esse caminho e que não terá volta. Tenho vergonha de fazer orações, tenho vergonha de olhar para as pessoas, tenho vergonha de mim mesma. Estou deprimida e só queria poder voltar ao passado e não ter tido aquela transa maldita. Será que um dia Deus vai me perdoar? Será que vou me perdoar? Quero me preparar pra engravidar novamente, só que do meu marido, do meu parceiro. Aventuras, nunca mais!

#clandestina78

Negra, 29 anos, Rio de Janeiro.

Olá meninas , achei muito interessante das página e queria desabafar sobre meu procedimento para vocês.

Acabei descobrindo minha gravidez com 6 semanas de uma recaída com meu ex noivo, isso resultou numa gravidez indesejada. Passei 9 anos com ele e nunca tive um susto, uma única recaída acabou acontecendo.

Estava desesperada e sozinha , ele falou pra eu me virar aí ninguém mandou querer dar o golpe nele achando que ele iria voltar comigo.

E assim fui desesperadamente atrás de alguma clinica no Rio de Janeiro eu pudesse me ajudar.

Acabei entrando em alguns sites e achei um tal moça chamada Débora, pediu uma documentação e exame e me explicou brevemente o procedimento. Ela foi um anjo!

Marquei o dia e fui até o local que ela me passou , cheguei lá estava suando frio e passando muito mal (já estava em jejum conforme foi pedido).

Estava numa sala de espera , quando o médico me chamou.

Entrei ele me fez várias perguntas e lá ele perguntou, você tem certeza da sua decisão?

Eu firmemente respondi que sim e lá se foram os 5.000,00 mais bem pagos da minha vida.
São ótima, foram 30 minutos … apaguei!

Quando acordei já me senti diferente.

Hoje após tudo isso estou ótima, feliz e seguindo minha vida como se isso não fosse um peso.

Eu realmente não estava preparada pra encarar isso sozinha e não me condeno por isso.

#clandestina77

Branca, 22 anos, São Paulo.

É a típica situação a qual achamos que nunca vamos passar. Sempre me cuidei, já ouvi histórias e sempre pensava que estaria longe de vivenciar algo assim. Confesso que algumas cheguei a pensar que a pessoa foi burra ou teve culpa, mas convenhamos que não cabe a mim julgar ninguém.

Tomei pílula por alguns meses há 4 anos atrás, mas devido as mudanças que meu corpo foi sofrendo achei melhor parar, nunca precisei muito, não mantinha relações sexuais frequentemente, então camisinha era um método bom para mim.

Fiz intercâmbio para um país onde o aborto é legal, conheci um cara maravilhoso que também era de um país onde o aborto é legal e gratuito. Ficamos um tempo juntos, mas como já estava com minha volta marcada não criamos esperança de que continuaríamos nos vendo, aproveitamos ao máximo o tempo que tínhamos e foi maravilhoso.

Uma bela noite a camisinha estourou, sabia que não estava no meu período fértil porque controlo minha menstruação há anos, mas não quis arriscar então logo na manhã seguinte saímos para comprar a pílula do dia seguinte. Tomei a pílula, compramos camisinhas de outra marca para não correr o risco novamente e continuamos aproveitando os dias que seguiram, já estava na semana de minha volta.

Sempre fica aquele medo, e se a pílula não funcionar? Mas dessa vez não senti esse medo, afinal anoto tudo e estava de fato no meu período ‘seguro’ para sexo.

Voltei para o Brasil, passados alguns dias percebi que minha menstruação não veio, pensei que poderia estar atrasando devido a pílula. Achei melhor esperar um pouco mais.

10 dias e nada.

Contei para uma amiga e resolvemos comprar um teste de farmácia. A primeira listra era bem forte, a segunda nem tanto, ficamos na dúvida, mas naquele momento já sabia que era verdade.

No dia seguinte fiz o exame de sangue para não restar dúvidas, mas nada novo, deu positivo e pelos níveis estava de aproximadamente 4 semanas.

Em nenhum momento eu pensei em manter a gravidez, foi instintivo, 22 anos, estudante, desempregada, morando com os pais, completamente sozinha. O cara não ia me ajudar muito, 22 anos também, estudante e morando em outro país, no fundo sabia que a responsabilidade sempre cai em cima da mulher.

Tenho duas amigas que passaram pela mesma situação um ano antes de mim, uma resolveu numa clínica, o que pra mim estava fora de cogitação, não tinha nem metade do dinheiro e não queria contar para o cara. Minha outra amiga me passou contato de um coletivo que indica lugares para comprar o medicamento e dão assistência psicológica.

Eu queria resolver aquilo o quanto antes. Enquanto estive fora do país trabalhei e me banquei sozinha, morava sem meus pais e em um país de primeiro mundo. Chegar aqui pra começar do zero e ainda grávida não foi nada fácil.

Marquei com o coletivo na data mais próxima que eles tinham, em 2 semanas, mas estava com muita pressa, tudo me deixava mal, não conseguia sair, não me sentia bem em casa, odiava ter que ver as pessoas e fingir que nada estava acontecendo e fingir que estava feliz por voltar.

Pesquisando encontrei três contatos que conseguiriam o remédio mais rápido, duas eu não senti a menor segurança, parecia mais uma transação financeira e eu achei que tentariam tirar vantagem de mim. A terceira foi muito amigável, me contou que ela mesma passou pela mesma situação, me explicou como foi o procedimento e ficou a disposição para eu tirar dúvidas, ela disse que não vendia o medicamento, só repassava, então não teria lucro nenhum.

Pedi que ela pegasse para mim e no meio da semana ela já estava com ele em mãos. Quando nos encontramos eu estava com muito medo, não conhecia a pessoa e só conseguia pensar no pior, e se ela estivesse armando para eu ser pega? E se não funcionasse? Viver num país onde o aborto é ilegal não impede que as pessoas abortem, só faz com que as pessoas façam o procedimento sem a menor segurança e muitas acabam morrendo no processo.

Acabei contando para o cara, afinal não era um problema só meu, queria dividir a responsabilidade e ter alguém do meu lado. Ele tentou me dar apoio, mas eu percebi que infelizmente a mulher está sozinha nessa hora. Ele não ofereceu dinheiro e eu não tive coragem de pedir, não acho que tenha feito a escolha errada contando, mas me decepcionei muito.

Gastei todo o dinheiro que tinha, fiquei com 5 reais na conta, mas valeria a pena, afinal eu conseguiria voltar a ter minha vida.

Tomei 2 comprimidos e inseri 2 na vagina. 1 hora depois e não sentia nada. 2 horas e nada. 5 horas e nada. 10 horas e nada. Mandei mensagem avisando que não tinha acontecido e a menina me disse para continuar deitada, pois demorava mesmo. Mais de 12 horas esperando, torcendo e absolutamente nada aconteceu.

O desespero foi enorme, não tinha dinheiro, coloquei toda a minha confiança na menina e não acho que tenha sido por maldade, mas de boas intenções o inferno está cheio, é muito irresponsável repassar algo que nem você tem certeza que vai funcionar. Fiquei com tanta raiva, medo e ainda mais insegurança.

Fui na consulta no dia marcado e a médica me pediu um ultrassom, naquele ponto eu já havia pesquisado muito e estava com medo de ter uma gravidez ectópica. Fiz o ultrassom e não parecia real, eu vi o que estava dentro de mim, mas não parecia nada, não senti afeto, não senti medo, nem receio, não senti nada, era muito estranho, só queria acabar logo com essa etapa.

Liguei no telefone que me passaram e consegui marcar para pegar o remédio no final da semana, o medo surgiu novamente, e se forem atrás de mim? E se eu for pega? E se não funcionar? O medo de estar fazendo algo ilegal somado ao medo de abortar e estar sozinha são horríveis, me senti uma pessoa ruim por um tempo, mas eu só estava cuidando do meu futuro, nunca tive vontade de ser mãe e sempre achei ridículo não poder ter direito sobre meu próprio corpo. Ninguém tem o direito de me fazer manter uma gravidez que eu nunca quis.

Nesse ponto eu já não tinha mais dinheiro, por sorte meus pais me deram dinheiro para passar o mês (alimentação e transporte) e foi com ele que consegui pagar o remédio (3 vezes mais barato que o anterior inclusive).

Foi me dado 1 comprimido de mifepristona e 6 de misoprostol. Muito mais do que a vez anterior. Tomei o mifepristona e 24 horas depois coloquei 4 comprimidos de misoprostol debaixo da língua por 30 minutos, depois engoli o que sobrou. Passados poucos minutos eu já sentia algo acontecendo, não era cólica, não sei explicar. Senti muitos calafrios e um pouco de enjoo. Me deu diarreia e um pouco de cólica, nada forte.

3 horas depois coloquei os outros 2 comprimidos debaixo da língua e depois de 30 minutos engoli novamente o resto. Estava com muito medo da dor, pois havia lido que é uma dor muito forte e um sangramento intenso. Eu já estava quase de 9 semanas então estava esperando muito sangue e dor.

Acabei dormindo e acordei 2 horas depois com vontade de ir ao banheiro, quando sentei senti o sangue escorrendo, nada assustador, uma quantidade razoável de sangue.

Voltei a dormir, acordei novamente e senti o que acho que tenha sido o coagulo que tanto falam, mas não foi muito grande e nem senti a dor que todas as mulheres tanto falam.

Eu havia tomado ibuprofeno para a dor e não sei se foi isso que fez o procedimento ser tão tranquilo quanto foi, eu estava esperando o pior, mas foi muito mais fácil do que eu imaginava.

A menstruação continuou por aproximadamente duas semanas, as vezes coágulos pequenos saiam, mas nenhuma dor.

As chances de eu estar grávida eram quase zero, eu me cuidei, mas infelizmente acontece com algumas mulheres, hoje vejo que se tivesse mantido a calma desde o começo teria sido algo muito mais fácil e menos traumático. O aborto vai acontecer, o Estado querendo ou não, nós temos controle sobre nosso corpo e a decisão é nossa. Algum dia se eu quiser ter filhos terei e nunca vou me arrepender do que fiz, não era o momento certo.

#clandestina76

Branca, 27 anos, Porto Alegre.

Sou casada, tenho um filho de 05 anos, tinha iniciado um novo emprego fazia pouco tempo.

Depois que engravidei á primeira vez, sempre me cuidei, tomava os remédios, eu e meu esposo mal estávamos tendo relações, e minha menstruação não desceu, meu marido insistiu pra comprar um teste,compramos quando chegamos do serviço, mas eu tava confiante que não tinha motivos pra ter alguma coisa. Ele já estava ansioso, perguntava se eu já tinha ido ao banheiro, quando finalmente fui meu mundo caiu, eu desabei.

Não entendia como e nem porque, mas nossas condições não são boas, moramos em uma casa de duas peças nos fundos dos meus pais, não temos nem como fazer um quarto pro meu filho, sonhamos em comprar nossa casa, o serviço novo tinha vindo em boa hora.
Passei duas semanas num inferno, realmente não enxergava mais a luz do dia, entrei em vários sites, procurei clinicas clandestinas, todas absurdamente caras e a maioria em São Paulo ou Manaus se não me engano, continuei procurando, achei os remédios, mandei mensagem pra um monte, uma mulher de São Paulo me respondeu, disse que era confiável, mas todas dizem né?

No desespero que eu tava, resolvi confiar, fiz um depósito bancário no valor de R$ 900,00, foi praticamente meu salário todo, ela demorou pra postar o código, e o medo de ser golpe? Pedi 8 comprimidos, não fazia ideia de quanto tempo eu tava, não quis ir ao médico, não quis fazer eco, imagino se fizesse e ouvisse o coraçãozinho batendo, não sei o que faria, tive medo.

Finalmente os comprimidos chegaram, fiquei o dia todo em jejum, coloquei 6 embaixo da língua e dois lá embaixo, meu marido me ajudou, senti muito, muito frio, calafrios horríveis, acho que dormi umas duas horas só, acordei e nada… começou me bater um pavor tão grande, medo de não ter dado certo, de nascer um bebê com sequelas por minha culpa, umas quatro horas da manhã começou a descer, senti um alivio maior.

Fiquei em casa naquele dia, e minha chefe falou que se eu não fosse trabalhar me colocaria no olho da rua, minha sogra ficou cuidando de mim um pouco, mal conseguia me levantar que sangrava muito.

No dia seguinte, mais recuperada, pedi as contas do emprego, não consegui aguentar a pressão, sangrei por uma semana, quando criei coragem de ir no médico e falar que “achava” que tinha abortado, a doutora só faltou me jurar que não, que era normal, mas me deu uma Eco pra fazer, fiz morrendo de medo de ainda assim ter algo, e enquanto eu ia á caminho, repetia comigo mesmo, não tem nada! não tem nada!

Tinha alguns restos fetais, então á noite eu fui em um hospital público em Porto Alegre, falei o mesmo, que tive um aborto espontâneo, não sabia que estava grávida, fui bem tratada, coletaram um exame de sangue, pois só pela Eco me explicaram que poderia ser um coágulo, e que talvez eu não estivesse grávida, mas mesmo que eu tivesse, não precisaria fazer uma curetagem, pois meu organismo iria se encarregar de expelir o resto.

Juntaram-se umas 8 enfermeiras numa sala para me dar a notícia que realmente tinha sido um aborto, e eu não conseguia nem chorar, só estava com medo de alguém me perguntar alguma coisa, mas ninguém perguntou nada, só falaram que se eu quisesse tentar de novo, era pra esperar uns 3 meses.

Hoje eu continuo tomando pílula e uso camisinha, mas psicologicamente ainda não estou bem recuperada, fazem alguns meses né.

Sim! Nenhum método contraceptivo é 100%, engravidei tomando anticoncepcional, é um absurdo quem diz que só engravida quem quer.

#clandestina75

Branca, 25 anos, São Paulo.

Quando descobri que estava grávida, entrei em desespero. Chorava dia e noite, mal tinha vontade de comer e dormia em qualquer lugar. Descobri a gravidez com o meu namorado que, na hora, me disse que faria o que eu optasse, que eu decidisse sobre meu corpo.
Comecei com chás (todos os possíveis que encontrei) e nada. Comecei a contar para alguns amigos e todos me ofereceram ombro, dinheiro, ajuda.

Todas e todos me indicaram contatos de médicos e pessoas que vendem o remédio. Eu não me sentia segura, pois tinha acabado de acompanhar dois casos gravíssimos de conhecidas que tomaram o remédio. Ao mesmo tempo, eu estava desempregada e não tinha grana pra bancar um procedimento médico.

Por fim, pedi ajuda a um outro amigo, que me levou a outras pessoas e consegui ambos os remédios, de forma segura.

Peguei dinheiro emprestado de um amigo e fui buscar. Tomei o primeiro no mesmo dia e segui os procedimentos conforme explicado. Estava de 7 semanas.

Senti calafrios, enjoo e muito sono. (Também tomei o analgésico liberado). Na primeira dose, expeli. Não sangrei demais, não tive muitas dores além das relatadas. Tive apoio de amigos e namorado 100% do tempo.

Fiquei abalada psicologicamente (sempre quis ser mãe, mas por ser universitária e estar desempregada, não poderia dar o melhor a criança) mas não me arrependo. Não era o momento.

Sou a favor da legalização sim. Acredito que toda mulher possa decidir qual o momento certo e se esse momento realmente existe. Acredito que todo ser mereça ser amado e uma gravidez levada q força é a pior forma de iniciar uma vida.